terça-feira, agosto 31, 2010

Sobre nós, os esteticamente macios ou regras para o bem viver entre pessoas de pesos diferentes ou confissões de uma gordelícia

Acho que nem quando meu pai era vivo e dizia com toda sutileza e doçura que era capaz "Você está tão gorda que vai morrer e eu vou ter que criar seus filhos!", eu me sentia tão patrulhada.

Aliás, hoje há uma patrulha ferrenha contra nós, os esteticamente macios.

E nem venham me dizer que a questão é a saúde e não a estética. Para quem olha, o que conta é SÓ a estética! Os adeptos da vida saudável tratam o emagrecimento com outra abordagem. Utilizam-se de outros argumentos: longevidade e bem-estar! A perda de peso é acessória.

Os olhos sensíveis, cuja gordura alheia incomoda, são os que patrulham. Daqui um tempo, vão instituir blitz contra a obesidade. Vão me mandar descer do carro, me pesar. Depois, vão me mandar embora apenas com uma multa e alguns pontos a menos na carteira. No meu caso, é apenas sobrepeso. Mas coitados dos realmente obesos! Esses vão ter seus veículos e carteiras apreendidos. Infração? Dirigir gordo. Gravíssimo!

Outro dia, lendo o blog da Maíra tinha o texto falando de uma parente cujos comentários a respeito das outras pessoas era apenas: "Você viu o fulano? está imenso!"; "E a ciclana? Emagreceu 20 quilos."; "Meu filho está obeso! Você nem vai reconhecer quando encontrar com ele".

E eu nunca tinha notado, mas eu escuto esse papo pelo menos uma vez por dia, vinda de fontes variadas, de gente que nem se conhece. Fulano engordou, beltrana emagreceu!

Que coisa chata ficar patrulhando a adiposidade alheia! Deixem meus pneus em paz!

Por conta da opinião dos outros já fiz loucuras. Tirando anorexia e bulimia, o resto eu já fiz em nome da boa forma: dietas radicais, sibutramina (que quase custou meu casamento, mas me deixou magrinha), floxetina, shake, laxante, vigilantes do peso, caminhada, corrida (certa feita, com um tombo humilhante), ioga... E todos deram certo por um tempo e apenas parcialmente. Afinal, quando a gente entra numa de emagrecer, a meta que nos impomos é realmente ambiciosa: se para o meu tamanho é considerado como peso ideal de 51 a 62 quilos, é claro que eu vou querer ficar com ... 49 quilos. Não há como evitar a frustração.

A questão é que eu já fui magra. Magrinha. Até meus 24 anos, eu nunca tinha feito uma dieta, nem sabia pra que servia. Então, quem me conheceu nessa época cobra de mim minha antiga magreza, como se ao invés de ter ganhado peso, eu tivesse exterminado uma raça de passarinhos raros da Amazônia. Falta mandar me prender. Excesso de pança.

Nesses 12 anos em que eu luto contra meu peso não consegui usufruir nem mesmo de uns 2 anos de magreza. Isso se eu juntar todos os períodos em que eu fui magra. Os outros 10 anos foi a sensação de inadequação que reinou.

É claro que é bacana ser magra, entrar numa roupa linda sem ter que fazer trambique, jejum prolongado, ficar bem de biquini... Eu também queria isso. Mas hoje eu estou com 36 anos, passei por duas gravidezes, nunca fui de fazer exercícios na vida (e agora meu corpo sofre com minha indolência pretérita) e gosto de comer. Não dá pra agora, querer virar Gisele, né? O que tento hoje é ser saudável, ainda que isso não seja o esteticamente correto. Quer saber? Foda-se o esteticamente correto! Eu quero ser é gordelícia!

A gordelícia não é magrinha, mas é bem cuidada. Unhas feitas, depilação em dia, cabelinho bonitinho, batonzinho, roupa bacana... A gordelícia tem sempre alguém do lado que saberá apreciar todos os benefícios de sua abundância! A gordelícia tem amor próprio em cima, tem atitude. Vê beleza na opulência! Viva o peitão e o bundão!

Então, de hoje em diante, seja eu gordelícia ou eventualmente magra (durante o efeito de uma dieta qualquer!), neste momento solene, eu decreto as regras da boa convivência entre pessoas de pesos diferentes (porque aqui eu vou falar sobre os gordos porque a minha vivência me leva a isso, mas vale também para aqueles magrinhos que são importunados por sua falta de peso):

1. Não falar para a pessoa frases como: "você precisa emagrecer!", "você está gorda!", "por que não tenta uma dieta?", "você não quer emagrecer?". Gordo também tem espelho em casa, também sobe em balança! Gordo sabe que é gordo E QUER EMAGRECER! Seja por razões estéticas ou de saúde, nós morreremos tentando ser magros, acreditem!

2. Não fazer fofoca do peso alheio! Ficar comentando que fulano engordou ou emagreceu não trás nenhum benefício à conversa e só mostra a futilidade do interlocutor.

3. Se um gordo disser "eu estou gordo", tente não tecer comentários a repeito. É apenas uma frase solta, um lamúrio, uma constatação melancólica. Não é uma brecha para você dar uma lição de moral utilizando expressões como "vergonha na cara" e "força de vontade". Isso só estimula nossa vontade de nos empanturrar com bobagens. Se você tiver muuuuita intimidade com o gordo em questão, pode até passar uma dieta, dar o endereço de um endocrinologista ou do vigilantes do peso. MAS ISSO SÓ SE ELE TE PEDIR!

4. Nunca xingue ninguém de rolha de poço, Shamu, bola, balão, bolo fofo ou qualquer outra coisa esférica. Dói! Aliás, gordo tem nome. Não chame ninguém de gordo.

5. Se você encontrar um amigo que já foi gordo e emagreceu troque a expressão: "Nossa, você emagreceu!" por "Nossa, como você está bonito" ou "Nossa, como você está bem". É muito mais simpático!

6. Não fale do rosto bonito de um gordo para elogiá-lo. É crítica mascarada de elogio. Terrivelmente grosseiro.

7. Pare de tentar mudar as pessoas. Isso é preguiça (ou medo?) de admitir os próprios defeitos. Olhe mais para si mesmo e vai descobrir que há algo a ser trabalhado. Viva e deixe viver!

8. Seja feliz!

E viva a diferença!

3 comentários:

Paty disse...

Ju, esse "post" está excelente! Que desabafo! Serviu para todas nós gordelícias! Beijinho

Denise disse...

Fui ao inferno e voltei tentando ser magra de novo. Achando que perder os muitos quilos a mais seria a solução pra todos os meus problemas e a chave para a felicidade eterna. Há dias que são meio complicados, mas tenho certeza que a Gisele também tem dias assim. Hoje posso dizer que estou me achando a GOSTOSA do pedaço.
I love you, Ju!

Isis disse...

viva a diferença e o entendimento de que ser diferente é só mais uma forma de ser feliz!!!!!

amooooooo tu nega!!!!